DEBAIXO DO POLEIRO!


DEBAIXO DO POLEIRO !

João J. C. Sampaio


O poder exerce um fascínio indescritível. Ele toma conta de nossas vidas como tiririca em horta mal cuidada. Não há como negar tal sede que consome as nossas entranhas. Regra geral, confundimos essa tendência com o significado de autoridade. No dia-a-dia, o exercício de poder se manifesta aos montes, por palavras ou atitudes, nos seus mais diversos escalões, justificando o refrão popular. “quem pode mais chora menos”. Em algumas famílias ou entidades, o que manda menos puxa o rabo do gato ou grita com o cachorro!

O poder se tornou o talismã mais cobiçado do planeta. Ele, como parasita, ocupa a preferência dos corpos e das mentes que acreditam que o mundo é o seu trono, cercado de subalternos e puxa-sacos de todos os lados. Ele se encarna, frequentemente, nos estreitos de espírito que acreditam que podem tirar o máximo de proveito dos bens alheios.

Como o poder, regra geral, favorece o fácil enriquecimento, o pretencioso acumula muitos bens e com eles ainda se apropria de um saber mais apurado nas melhores escolas, o que favorece a manutenção no espaço privilegiado que conquistou. Se precisar, com discurso reticente, passa por cima de seus semelhantes sem o menor constrangimento! Afinal, o que não pode a razão pode a força.

O poderoso, que sempre se julga o bom, também tem consciência de que pode despencar do poleiro. Em condições adversas ele se torna mais perigoso ainda.. Alardeando bondade ou se fazendo defensor, enfraquece mais o pobre, ignora o pequeno, exclui o miserável e abandona os amigos que o olham com desconfiança. Em condições extremas promove a violência, semeia dúvidas, mente descaradamente, sanciona leis que o protegem e, quando falham esses propósitos faz desaparecer da terra dos vivos quem ouse se interpor em seu caminho.


Não é por acaso que o poleiro tem fama de gerar muita imundície! Mas, o empoleirado, mesmo cheirando mal, jamais perde a pose... Usa também de estratégias que agradam aos olhos dos incautos: dá algumas esmolas, acaricia as crianças, apresenta-se como religioso, tem a mídia a seu favor, se move sempre na direção conveniente e carrega a aparência de santidade. Em certos momentos, multiplica essas ações com vistas a mais poder. É um verdadeiro expert no exercício ideológico que conserva as massas na mesmice e na sua ilusória felicidade.


Como cristãos que desejamos ser, esse discurso ou postura de poder não deveria ocupar espaço em nossas existências. Jesus, o nosso Mestre e Senhor, insiste em quebrar essa relação poder/subserviência. Aliás, com Ele não há esse papo de ser o maioral, o primeiro, o mais importante, o dominador. Chega a ser paradoxal em sua afirmação: “quem quiser ser o maior seja o último e o servo de todos” (Lc. 22, 26 e Mt. 20, 20-28). Só assim pode-se construir um espaço onde a fraternidade perambule livremente, sem a concorrência das famosas clínicas de massagens do ego ou das escolas superiores da egolatria, egoísmo, egocentrismo, egotismo ou egomania.


Está provado que essa forma rudimentar e incoerente de ser, vem tornando a vida descaracterizada, banalizada e, em muitíssimas situações, descartada. O salmista bíblico, sentiu na pele tal problema e se expressou lamentando: “Tornei-me um estranho para meus irmãos...” (Sl. 68, 9). A sua lamúria é atual. Quando o olhar só contempla a própria imagem, até os mais próximos se tornam desconhecidos...


O Mestre e Senhor Jesus não encerra o assunto por aí. Sugere que desmontemos a sede de poder nos mínimos detalhes: “se deres uma refeição convide os pobres que não têm como retribuir...” ( Lc. 14, 12-13) ou “considerem-se apenas servos que não cumprem mais que a obrigação” ( Lc. 17, 10), busquem ser o “sal da terra e a luz do mundo” ( Mt. 5, 13-14), “não julgueis” (Mt. 7, 1-5) e assim por diante. Na prática, Ele não quer que assumamos jamais as posturas dos escribas e fariseus de seu tempo que se julgavam os bons (Mt. 23).


Quem, realmente, se decidiu pelas propostas do Reino, será sempre um servo de Deus atento às necessidades. O seu poder se manifestará no constante gesto amoroso e transformador que continuará a gerar a fraternidade no abençoado espaço do comunitário.

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