PÃES, PEIXES & CIA
PÃES, PEIXES & CIA.
João J. C. Sampaio.
No mundo rural de tempos atrás onde vivi, era habitual entre as famílias a prática da partilha. Quando um dos vizinhos matava um porco, por exemplo, os mais chegados eram agraciados com uma porção de carne e uma invariável justificativa: - “desculpe ser tão pouca, o porco era pequeno...” As mesmas demonstrações de carinho podiam ser verificadas nos momentos de doença, quando nascia uma criança ou, simplesmente, quando havia a necessidade de se emprestar algum objeto. Um vizinho, de certo modo, olhava pelo outro, apesar da pobreza que, regra geral, tomava conta de todos!
Atitude semelhante ocorreu com a pessoa de Jesus que, vivendo em um espaço cultural diferente do nosso, também esteve atento às necessidades humanas e tratou os mais desamparados com misericórdia. Foi assim que multiplicou uns poucos pães e uns peixinhos para uma multidão cansada e faminta (Mt. 14, 14-21). Ele, de certo modo, realizou o mesmo gesto dessas comunidades rurais que jamais permitiam que as suas visitas fossem embora sem comida ou sem um cafezinho.
Jesus foi mais longe: pediu que o povo se acomodasse para comer. Assentar-se naqueles tempos era privilégio dos ricos, sempre atendidos em pé pelos seus serviçais. Permanecer sempre em pé, de prontidão e, muitas vezes acordado, era a obrigação do servo para socorrer os seus senhores em suas mínimas exigências. Jesus, que mais tarde iria lavar os pés dos apóstolos sentados à mesa, desta vez também assumiu a condição de servo bom e fiel, fazendo com que o povo se assentasse para ser servido. Atitude rara! Só mesmo esse Senhor seria capaz de reconhecer a importância do seu povo sofrido e fazer alguma coisa por ele! Com esse gesto ainda deu-nos a entender que a profecia de Isaías, que convidou a todos a comerem e a beberem sem pagar, poderia se tornar uma realidade, se quiséssemos (Is. 55, 1).
O apóstolo Paulo, um sujeito duro na queda, também descobriu o significado da compaixão, da amizade, do amor que não conhece limites, a ponto de lançar um desafio: “quem nos separará do amor de Cristo (Rm. 8, 35)? Não é por acaso que as Escrituras também nos garantem que: “quem encontrou um amigo, encontrou um tesouro (Ecl. 6, 14)!”. Na pessoa de Jesus de Nazaré encontramos muito mais!
Trazendo o exemplo de Jesus para o chão das boas semeaduras, concluímos que está mais que na hora de assumirmos as suas ações salvadoras. Só experimentando o sabor da compaixão e da amizade é que a partilha se concretizará. Importa, porém, deixarmos de lado as nossas inúmeras justificativas, aparentemente corretas que usamos para fugir de responsabilidades como fizeram os discípulos ao aconselhar o Mestre a despedir o povo para que cada um buscasse o seu alimento (Mt. 14, 15).
Imprescindível mesmo é ser como Jesus, que compartilhou com aquela gente sem rosto, sem voz, sem direitos, abatida pelos desenganos, a comida que tinha à mão e o estímulo a prosseguir.
Como seguidores desse Mestre da misericórdia, precisamos como servos fiéis permanecer mais em pé, menos encastelados em nossas mordomias e lutar para que a fraternidade e a justiça se estabeleçam cada vez mais entre nós. Comecemos, porém, pela simples distribuição dos “doze cestos cheios” (Mt. 14, 20) de sobras que estão embolorando em nossas casas!
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